As imagens e ideias que passam na mente e que são transmitidas, são transientes, e não constituem uma verdadeira representação da realidade. A maioria das vezes representam uma percepção da realidade que tem em si várias componentes que incluem a vivência do próprio indivíduo, as suas características e as suas motivações (a sua consciência).
Acreditar que o que ouço é verdade pode levar-me por caminhos insanos.
Vamos pensar na crítica que me fazem. Pensemos na crítica directa, em alguém que me confronta com o meu próprio comportamento. Quando ouço essas palavras, e ainda mais se forem acompanhadas de um tom de desprezo, de ironia, de zanga ou de violência, nasce em mim um sentimento de inadequação, de medo, de vergonha, como se quisesse fugir para qualquer lado onde não fosse possível ver aquilo que aquelas palavras estão a dizer de mim, da minha pessoa, do meu Eu.
De repente, esqueço-me que essas palavras são isso mesmo: palavras. Não são a realidade, não transmitem o que eu fiz e muito menos quem eu sou.
Tenho várias recordações desse sentimento de inadequação resultante do próprio facto de os outros não me entenderem, de me verem somente à luz da sua própria vivência e não poderem portanto perceber-me, entender-me.
O que fazer então? Que recursos tenho que me permitem manter a clareza e o foco e continuar a ver a realidade e a minha consciência?
Como transformar estas ocasiões em ocasiões em que eu não perca e o outro também não?
Não adianta responder à letra, não adianta rebater… Se verifico que estamos em sintonias diferentes, em níveis de entendimento diferentes, em realidades divergentes não adianta querer que haja ali e agora uma sintonia porque ela não é possível. Há que primeiro fazer o caminho para uma plataforma comum, um lugar onde possa haver verdadeiro diálogo, onde se possa de facto ouvir e ser ouvido. Para que isto seja possível, é necessário que ambas as partes queiram fazer esse percurso. Não é algo que possa ser realizado por uma só parte, como uma viagem solitária. Porque este caminho implica eu estar disponível para mudar, para perceber o lado do outro, a sua ideia, a sua perspectiva a sua consciência.
Neste caso o que interessa então é a descoberta do caminho que pode levar-nos a um encontro. Não adianta aprofundar os meandros do desencontro.
Os factos e acontecimentos reveladores do desencontro são ferramentas inestimáveis para percebermos a distância a que estamos. Por vezes a distância é tão grande que penso que não há hipótese de reatar e de ser possível o retorno a uma plataforma comum.
Normalmente é a dor e o desconforto que possibilitam um regresso. A dor que agora sinto em relação a algumas situações, essa dor de me sentir afastada, incompreendida, separada, isolada. É esta dor que proporciona o desejo do reencontro, o perdão e a compaixão.