Correr para o nada
O tempo foge-me por entre os momentos que desejei que fossem grandes e infindáveis para que lá coubesse tudo o que era preciso.
Com uma vontade imensa de participar, de colaborar, de intervir, com essa noção de tudo o que ainda falta fazer nesta vida e neste contexto, com um sentido de suposta responsabilidade, querendo resolver as questões que me aparecem à frente dos olhos e também aquelas que me aparecem um pouco mais de lado, à frente dos olhos dos meus filhos, da minha família, dos meus amigos, desejando poder contribuir para um mundo melhor, uma sociedade mais justa, melhores pessoas e relacionamentos, ansiando poder resolver ou pelo menos contribuir para solucionar os conflitos, com os olhos postos num horizonte de ordem e de harmonia completamente impossível, desgasto-me numa corrida sem fim e numa luta sem tréguas.
Páro, ofegante.
Páro, ainda e mais uma vez.
Torno a parar, para tomar consciência de que estou parada.
Desligo os sons que me envolvem sem descanso; apago as luzes que brilham de dia e de noite para que eu não tenha hipótese de perder nem uma pequena partícula; impeço-me de ver e ler todas as letras e palavras que me espreitam em cada rua, em cada esquina, em cada transporte, em cada montra.
Deixo-me ficar assim, no silêncio, no escuro, no vazio, no nada. Devagar, o meu ritmo vai abrandando, a minha mente vai aquietando, a inércia do frenesim vai parando devagarinho.
Subitamente, começo a perceber, a sentir, a ouvir o meu corpo, o meu eu.
Fico comigo com essa sensação de ter chegado a casa, de tudo estar bem, de afinal já nada haver que precise de mim.
Evidentemente que tudo está bem. É claro que sim. Sem dúvida nenhuma.
Tudo o resto foi apenas uma ilusão que passou por mim que nem um vulcão.